Um domingo
Paulo Mendes Campos
Diante da Lagoa Rodrigo de Freitas, eu nada tinha a fazer, nem a pensar; nem a sofrer: Reconhecia as coisas. A cor da água que parece olho baço, a cor da relva, a cor do eucalipto, a cor do firmamento, que era uma cor de líquido azul. Estava sentado com os olhos abertos, num banco de pedra.
É bom que um homem, vez por outra, deixe o litoral misterioso e grande, querendo contemplar uma lagoa. O mar, este é terrível e resiste à nossa sede com seu sal profundo. Sim, são belas as palavras do mar: hipocampo, sargaço, calmaria. Oceanus. No entanto, uma lagoa, muda e fechada, compreende as nossas pequeninas desventuras, o efêmero que nos fere. Nenhum poeta seria tonto a tal ponto de escrever ao lago uma epopeia, uma saga. Nele podemos esquecer apenas os nossos naufrágios.
O domingo se aquietara, quando passou zunindo um automóvel vermelho. O ar continha tubos translúcidos e dentro deles revoavam urubus. São as aves mais feias do céu, mas têm um belo voo alçado e tranquilo.
Um pequeno barco a vela seguia o caminho invisível do vento. Depois, surgiram outros barcos, todos brancos e silenciosos. Acrescento que nada mais bonito existe do que um barco a vela. E havia também as casas dos pobres do outro lado, construções admiráveis no ar.
O sol foi acabando. Levantei-me do banco e fui embora. Pensando: há domingos que cheiram a claustros brunidos pelo esforço dos noviços. Aquele, entretanto, tinha um perfume de outono.